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Numa altura em que voltam os relatos de praxes abusivas, trago-vos o meu testemunho como participante destas “atividades lúdicas e recreativas”. Entrei numa faculdade onde não conhecia ninguém. Nenhum amigo me acompanhou, apenas uma rapariga que conheci no dia das matrículas e que viria a ficar na minha turma e um veterano que me ajudou no referido processo e se tornou no meu padrinho académico.

Hoje conheço muitas mais pessoas e fiz imensos amigos, entre caloiros, graúdos e veteranos. O que facilitou esta adaptação? Sem dúvida alguma, a praxe (mas não só)! E não, quando falo em praxe não falo de agressões morais e psicológicas, não falo de atividades de risco, não falo de seitas e muito menos de obrigação. Falo de jogos, brincadeiras, convívios, ações de solidariedade e muita, mas muita mesmo, diversão.

Posso dizer que escolhi uma ótima faculdade, não só em termos de formação mas também no espírito de companheirismo e entreajuda, algo que por vezes as pessoas se esquecem. Vivi momentos incríveis durante este período e posso salientar alguns. Na primeira semana de praxes passámos um dia a pintar o pátio de uma escola primária, perdida na Ajuda, que precisa bastante de remodelações. Entre cânticos, hinos e muita gargalhada, provámos que em equipa somos muito melhores do que separados. Agora, aquele que provavelmente se tornou no mais especial: o batismo do caloiro, quando o padrinho/madrinha reconhece o afilhado/afilhada como aluno e parte da escola que já se tornou na sua primeira casa. Garanto que nunca esquecerei a água gelada das fontes do Largo Camões que me escorreu pela cabeça e até às costas enquanto o padrinho que escolhi me prometia que estaria sempre lá para mim, nem a imagem das ruas da Baixa cobertas de capas negras enquanto cantávamos e convivíamos como um só. Nunca esquecerei a forma incrível como fui acolhida nesta nova etapa da minha vida nem o espírito e rigor académico que tanto me surpreenderam.
A todos os que não sabem se, quando chegar a vez deles, querem ou não participar nas praxes, não vou dizer “VÃO”! Digo antes: esta é a minha experiência e adorei-a, mas as pessoas são diferentes e, pelo que temos visto, as praxes também. Só não digam logo que não, experimentem e sintam-se livres para sair sempre que não se sentirem confortáveis. Sou totalmente a favor da hierarquia académica, mas a verdade é que nem um veterano ou um “Dux” nos pode obrigar ao que quer que seja. É preciso saber praxar e é preciso saber ser praxado. É preciso saber entrar no espírito e é preciso saber dizer não quando não concordamos com o que nos mandam fazer. Não é por não quererem participar que não vão conhecer ninguém. Uma das raparigas com quem me dou melhor no meu curso não foi a uma única praxe. Ela não concorda com esta tradição, eu sou assumidamente a favor (dentro de certos parâmetros) e ainda assim damo-nos bem.
Caso decidam participar, preparem-se para joelhos negros, dores de garganta, voz rouca, cansaço, dores de pernas e pés, bolhas, chegar a casa todo sujo e pintado e uma dose enorme de gargalhadas e diversão.
Mariana Coelho (ex-aluna da ESAB, caloira do Instituto Superior de Economia e Gestão de Lisboa)

 

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